21 maio, 2011

Atremar um recado.

A nuite já tinha ido á que tempos i já tava alpardo q’ando a minha grita da cuzuinha:
- Ó Jodé, alevanta esse rabo da cama, calça ei botas d’augua q’ôje ai sete i meia tãe-se augua de jiro n’Achada!
Lá de verdade já tinha paçado mai de 15 dêas cu levadeiro tinha passado ca augua d‘Achada e aqueles pés de fajão c’aprantei nas cazeiras dui baraços tavam cui grêlos toudos murchos mêmo carssidos d’augua nu trousso.
C’alquer maneira eu tava sempre á treita a vijiar s’ouvêa ú raio du levadeiro tucar ú búzio do cabeço, mei não. Ele, que tamãe é fresco i cassuadeiro, ai vezes inganava agente deixando ú búzio maiza pedaua e a caixa de ferro do cadastro pêndrada num bordão c’ afincava do camalhão na levada d’iréus, qéra pa se pênçar q’ ele tava perto, a limpar algum agulheiro ou trunadoiro. Maza maior parte dei vezes ele tava era incabádo da venda simburranchando de vinho sêco i a jogar á milhada maizu vendeiro.
Mei bãe, eu cá tinha d’ir canão só regava dali a 15 dêas i p’ralau ú fajão i úi baraços já tinham mais q’azoigado.
Antão abispei-me e pús as patas fora do catre. Vesti-me e mêmo ca cara inramelada foi da cuzuinha. Abri a cantuneira puxei a ragáfa du grogue i boi meio cales p’aquesser ei beiças. Mazântes buí um-ã xicra de café de cevada p’ao grogue nã cair a carão du estômego. Pão cá não havia da porta, ú raio du moleiro tamãe nã moeu-me ú grão p´mêdo ca augua tava pa trás de jiro e a minha nã pudêa amassar. Lá pão branco da venda nãe pençar. É c’ma diz ú ditado: pão branco e paleio não enche a barriga.
De bótas d’augua enfiadas neis patas ala p’lu caminho afóra ca inchada de pau ao ombro, corda e foice da curreia das calças e ainda um-ã saca veilha pa enxer de cuitivo p’mêdo fazer úm basculho.
Foi direito ao trunadoiro e deixei tudo a pau pa q’ando chegasse á ora. 
A levada, memo incabúcada da invernia que deu em Ferveiro,  trazêa um bom braço d’augua. Chegou a ora tapei. Foi pla levada abaixo limpando alguns matos i pedras até chegar ao meu eito. Inda mal tinha indreitado a augua pá cazeira e já a peste tinha cançado. Ó diabo, mas qãe serêa ú raio que me tapou a augua? Pencei eu.
Foi procurá-la. Na beira da levada já tava  ú levadeiro esprando p’ru mim.
- Ó Jodé, antão foste tapar a augua na hora do Antoino regar?  Aprantou-me ele lógo p’lei ventas p’ralau.
- Mas a minha disse q’era ai séte e meia e já passa! Arrespondi-lhe toudo esteprádo.
- Avizei-na pa regar ai séte e meia mazéra da tarde! Mai logo, não é agora! Atremaste?
Fiquei alcançado e pedi desculpa ao levadeiro e nã fão fiz mai nada. Ca reina que tinha vim pa porta imbalado c’até parssêa  a abeilha de curridas du Zeca Cunha. Q’ando cheguei da porta dei um-ã rezonda na minha, q’ela lá p’ser brába c’ma bezerra q’ando anda a boi, ficou mai mansa ca galinha xóca que tirou um-ã dúzia de bisailhos a semana passada.
Dali prudiante ela atremou ui recados du levadeiro!

3 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns ao compade Jodé, estimei a istória.
Era bom-ã era cu compade Jodé pujesse daqui máizum-ãs istórias destas pe mê-d´agente se arreganhar um pedaçum ui dentes, ca nãum anda tudum de beiças eim baixum.

Noss´Senhor lhe dêa um bom-domingum e saudinha da baua.

Anónimo disse...

Muito bom este texto!
Linguagem pura de Santana. O património linguístico e cultural de Santana está ainda por explorar!

João disse...

Custa a ler tal e qual o compadre fala mas devo confessar que está um espectáculo! Execelente!
Muitos parabéns e que venham mais textos destes.

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